terça-feira, 20 de novembro de 2012

“Ouwnnn... o 'bichinho'...”


Aqui no Ceará essa expressão é algo equivalente a: “Ouw o pobrezinho”, “o coitadinho”, etc... e confesso que me “dá nos nervos.”

Pensei neste assunto na sexta-feira a noite quando o seguinte fato foi relatado pela minha pequena:

Nadine levou uma boneca para a escola, mas não quis emprestar pra amiga que ficou chateada e disse que não queria mais ser amiga da Nadine que ficou triste por "perder" a amiga.

Depois de eu conversar e explicar que os amigos as vezes ficam chateados com a gente, mas que dá pra fazer as pazes, desde que ambos saibam compartilhar suas coisas.


Solução encontrada pela Nadine:
- Então vou chamar a Maria Luiza aqui em casa pra ela brincar com todos os meus brinquedos. 



Do episódio relatado, embora a lição sobre compartilhar os brinquedos seja importante, não foi a que mais me chamou atenção. E sim a questão do sentimento. 

Não foi assim "de pronto" que ela contou a história... Ela começou com uma carinha triste e a frase: "A Maria Luiza nem que mais ser minha amiga". Coube a mim investigar e entender o que tinha acontecido.

Se para muitos adultos não é fácil entender quando alguém diz que não quer ser seu amigo (mesmo que esse comunicação seja por meio de atitudes, e não verbal) imagine para uma pessoinha que acabou de fazer 3 anos?

Por favor não me venham com um: Ouw... a bichinha... Claro que nenhuma mãe quer que seu filho sofra nem fisicamente e nem emocionalmente, mas essas vivências são necessárias para o desenvolvimento do pequeno como ser humano.

Muitas vezes vejo mães tomando à frente e resolvendo os conflitos de relacionamento naturais entre as crianças, como por exemplo uma disputa por um brinquedo. Para que o “bichinho” não sofra a mãe vai lá e resolve por ele. Assim muitas crianças estão crescendo sem terem conhecimento do que é frustração, desapontamento, tristeza, melancolia. (Por sinal conheço alguns adultos que não sabem a diferença entre os 4 sentimentos que escrevi, nomeiam todos como “depressão”).

No entanto essa “proteção” toda acaba sendo mais prejudicial para a própria criança. O mundo não acha que ele é um “coitadinho”, as pessoas não vão tratá-lo como “o bichinho”.

Como atendo mães de diversas classes sociais e níveis de escolaridade gosto de ilustrar essa situação como o seguinte exemplo:

Imagine que você tem que aprender a lavar roupa, para começar você lava primeiro as peças íntimas (menores e com tecidos mais finos), depois passa para as camisetas, shorts, etc. Assim gradativamente você vai aprendendo a lidar com as dificuldades que vão surgindo.
Agora imagine que sua mãe não deixou que você lavasse nada, para que você não sofresse. O problema é que quando você cresce a vida exige que você saiba “lavar” e você vai ter que aprender começando por uma cortina de 2 metros (ou uma rede, pra quem é nordestino).


Se sempre que seu filho discute com um amiguinho, você vai lá interceder por ele, negociar no lugar dele, como ele vai lidar com a frustração de receber um fora da namorada, ou for demitido de um emprego? Certamente irá ser uma dor bem maior, já que ele nunca teve a oportunidade de senti-la numa gradação menor. É como dar uma "vacina"... a injeção dói (as vezes mais na mãe que na criança), mas a mãe sabe que é para o bem do seu pequeno.


Ah!...Voltando à história da Nadine na segunda-feira elas não mais se lembravam que estavam "de mal" e continuaram amigas :)

Cristine Cabral

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